sexta-feira, 22 de abril de 2011

HOMENAGENS E DESNORTEIOS






ESPAÇO ABERTO
Debate de idéias – Informativo da Associação dos Docentes da UFMT – Adufmat- nº70/2011

HOMENAGENS E DESNORTEIOS
Roberto Boaventura da Silva Sá
Dr. em Jornalismo/USP. Prof. de Literatura/UFMT
rbventur26@yahoo.com.br
Embora devesse, não falarei de Tiradentes; afinal, em anos anteriores já registrei sua importância. Hoje, apenas reafirmo: sua figura é uma das mais significativas em termos de lutas por ideais coletivos. Pena que agora Tiradentes só receba homenagens, inclusive dos atualizadores da mesma lógica mercantilista de sua época. Seus ideais deveriam ser praticados; afinal, a “derrama” ainda corre solta. Feito o registro, adianto: duas matérias jornalísticas e um fato ocorrido ao meu redor centralizaram minhas preocupações neste artigo.
A primeira das matérias trata da nova atividade de Lula. Após homenagens na Universidade/Coimbra, o novo e inventado “doutor”, sustentado pelo sistema capitalista, voará mundo em jatinhos particulares, proferindo “palestras”. A grande estreia não poderia ser em outro lugar: EUA. O público também não: agentes do capital. O que Lula ensinará aos “donos” do mundo? Como iludir um povo. Antes de tudo, aparentar-se como “politicamente correto”: amante dos pobres, das “minorias”. Depois, aniquilar a educação. Por fim, cooptar políticos, sindicalistas, professores et alii. Concomitantemente, distribuir migalhas disfarçadas em “programas assistenciais”: vales, bolsas, ProUni etc; ou seja, sobras de que o capital dispõe para adormecer povos socialmente desiguais. O Brasil é exemplo perfeito: sua concentração de renda é uma das maiores do planeta. Tempo médio das “palestras”: 40 min. Valor: de 200 a 500 mil reais! É assim que se recompensa os importantes agentes do sistema, não se importando se são grandes leitores ou se nunca leram um livro. Je suis désolé!
A outra matéria versa sobre homenagens que Ronaldinho Gaúcho recebera da Academia Brasileira de Letras. Motivo: os 110 anos do nascimento de José Lins do Rego, um escritor paraibano que aprendera a amar o Flamengo! É engano pensar que já vimos de tudo. De onde menos se espera, surgem aberrações. Pena que a vaidade do atleta tenha falado tão alto quanto a estupidez de quem pensou na homenagem. Se fosse humilde livraria aqueles “acadêmicos” do bizarro. Machado não merecia isso; nem Lins do Rego. Ronaldinho está para a leitura assim como um mendigo está para a fartura. Essa homenagem não acrescenta nada aos “moços, pobres moços”; ao contrário. A ABL já passou da hora de fechar as portas para entrar na história como um espaço que um dia teve importância para a cultura. A continuar aberta, Tiririca poderá ser o próximo homenageado.
Já o fato ocorrido ao meu redor foi narrado por um colega em recente reunião de Letras/UFMT. Em uma das aulas, tratou academicamente de dubiedades do signo linguístico, advindas da sonoridade. Ex: “fiz um churrasco. Comprei tantos quilos de carne. Dá para vinte comer?”.
Para sua surpresa, na aula seguinte, quando chegou, um estranho já ocupava o lugar, discursando aos alunos. Era um pastor evangélico e esposo de uma das acadêmicas. O “enviado de Deus” foi censurar o professor. Para o pastor, nosso colega não tinha o direito de ficar ensinando “aquilo” para os alunos.
Penso que Reitoria deveria acionar dispositivos legais que a intromissão exige; se for o caso, a Polícia Federal. A Instituição deve ser forte para resguardar a autonomia universitária (Art. 207/CF) e o direito de liberdade de expressão acadêmica (Art. 5º/CF). Se nada for feito, ela será responsável por tragédias que vierem a ocorrer. Bruxas e bruxos medievais voam sobre nossas cabeças. Esse fanatismo religioso é gravíssimo tipo de assédio moral nesta contemporaneidade medievalizada.